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quarta-feira, maio 26, 2004

Como é que se escreve a palavra ‘Adeus’ sem que as lágrimas se precipitem no desenho da grafia? Como é que se escreve o fim sem se desejar que o sorriso recomece. Aqui e no mesmo lugar de sempre… Lembro-me muito bem do tempo em que não te compreendia: o falar, o gesto, o toque… Depois tudo mudou – começaste a gostar de mim, e eu de ti. Juntos descobrimos que gostávamos um do outro. Eu já nem me lembrava de mim e tu focavas o olhar neste rosto que agora te perscruta por entre fotografias e gestos… produzidos pelo tempo, pelo teu tempo. Pelo teu tempo em mim, vincado em nós... O tempo que agora levo comigo, dentro de mim, bem encostado à sombra que me ensinaste a dominar, a compreender, enfim, a amar também. Porque também não amar, dirias tu se aqui estivesses… Quero muito que saibas que te Quero: sem reservas, a descompasso, a gritar sílabas que não sei combinar. Quero muito que saibas que hoje sou mais do que eu, muito, muito mais do que eu. Afinal, o teu gesto surtiu efeito… entre a lágrima que quebraste e o sorriso que imaginaste. Em mim, de todos os lados. De todos os ângulos da fotografia. Na imagem. Em silêncio. Meu ou teu?...

Hoje tive de estender e multiplicar a palavra, a minha palavra (lembraste dela?…) pela última vez, a ti, a eles, até mesmo a mim… Não chorei (ainda), mas gritei aqui dentro deste mundo que nunca te mostrei, mas que te desenha e respira a cada segundo. Gritei e disse: hoje deixo-te mas é só por um momento (breve e contido, Fixo.) porque aguentar este tempo sem ti é estar ao alcance da resposta num jogo que sempre se fez de perguntas. De amor.

Como é que se escreve a Palavra, perguntarias tu se lesses este texto… Eu não te sei responder… Apenas sei que o teu nome se escreve assim:.... e não é que me esqueci de mim outra vez…

Fim.


A.R.

sábado, maio 22, 2004

Bater de asa (berceuse para a libertação)


E se parte de mim partisse para o absoluto desconhecido, ficaria eu triste. Seria eu menos do que sou, menos do que aparento ser ou menos do que me deixam ser. Porque escrevo desconhecido quando quero dizer TU, grafado a gerar emoção e frio imenso, demasiado…

Fixo o meu olhar e pensamento em ti, na tua materialização possível e acertada pela minha mão trémula e insegura, mas que tu insistes em renovar a cadência, o movimento ininterrupto e contínuo. Porque pedes tanto de mim… porque me roubas o olhar (não sabes que é a única coisa que possuo tua no momento da despedida, no momento em que desistiria de mim para que pudesses continuar a palavra que me roubaste do corpo. O corpo que ainda lateja, lateja de ti. Vais voltar amanhã, agora ou neste preciso momento em que te registo na imagem sem linha final? Será que vais repetir palavras que nunca tinha ouvido antes, you are so beautiful, can I hold your hand (and your soul). Reconheço-te o sorriso, a mão sobre a minha mão. O beijo prometido. Aonde aprendeste a beijar assim?... Would you come with me if I left this place, pergunto-te… Sorris por entre os lençóis e guardas a resposta para amanhã… and what word should I utter quando me pedires para que sejamos felizes aqui, aonde as nossas mãos nunca se desenlaçam... Elas nunca se esquecerão de ti, mesmo quando não te perceber a palavra, o embaraço, a dor… Será que a reclamarei também para mim?

És tu a bater à porta…?

Ouvi a tua voz, finalmente, escreverei amanhã num outro poema, num outro tempo que há-de ser sempre o teu, porque eu não existo... Menti. Não me coloquei entre o tiro e o sorriso que me perfura. Sinto que menti nos lábios e nas mãos, mas deixa-me amar-te outra vez, como ainda hoje de manhã… E aí, juro que não mentirei. Acreditas em mim? Que sou eu outra vez? Que sou possível? Ouviste bem: possível.

E lá estou outra vez a brincar com a memória e o sonho… porque é que me deixas comportar assim?



A.R.

sexta-feira, maio 21, 2004

Este também não é nada mau...


deixa morrer devagar o meu medo no meio de palavras
que não compreendo, vêm do andar de cima e caem sobre mim
como se fossem pó: o gesso do silêncio. São estas as noites.
Despido, escrevo num caderno a viagem como se fosse uma
casa a habitar, assim me vejo sob gaivotas que vasculham no
lixo o alimento para uma fome um pouco trémula,
digo: é preciso esquecer as palavras para falar, é preciso
alguém dizer na minha boca os sons inaugurais, esta palavra
amo-te, tão esquecida dos lábios, esta palavra pobre, este equívoco,

tu falas junto a mim a tua palavra,
mas eu não sou a pessoa que a conhece


Rui Nunes

terça-feira, maio 18, 2004

De que corpo há-de brotar a energia que me falta?
De que mente há-se nascer o sonho que não sabes desenhar?

Eu não sou eu; sou tudo o que não desejei para mim
Não me reconheço por entre os signos da tua representação

De onde existo se não me levanto para te beijar?
Para te afagar o corpo que deixaste antes de sair

Irei olhar para trás, na hora da despedida?
Na hora em que me disseres baixinho, por entre abraços alheios:

“Qual é o teu nome?”

E que resposta esperarás de mim? Metade de mim ou palavra completa.
Só sei que dar-me-ei: atirado em silêncio contra o teu peito, desfeito mas tão pleno.


Para ti, Sofia, que sempre soubeste aonde reside esta vontade que nunca nomeamos a dois. Obrigado pelo telefonema… é sempre um prazer ouvir a tua voz doce. Será que vais ler o meu blog?...


A.

quarta-feira, maio 05, 2004

Reli o teu texto (Abril, 18) porque precisava de força, acalento. Já não falo contigo há algum tempo. O telemóvel está mudo (cada vez mais) e eu não sei o que fazer.
Perguntavas se te aguentavas, se me aguentava, se nos aguentávamos. Eu continuo a olhar no infinito a estrela que me apontaste como tua, lembraste? Por outras palavras, eu aguento-me. E tu?
Diz-mo agora, porque preciso de continuar ou parar, pois ficar assim, neste meio, é que não dá.

Should I ‘Try’?



* A.R.
Há textos que merecem estar entre os mais lidos do mundo. Este é um deles:


Pietà


Sentamo-nos os dois. O frio, perpendicular, abafa qualquer comiseração.
Sempre vagabundos de nós, tudo nos falta menos a rua. Esta noite um som
ecoa, a luz, acre, levanta o peso do calor, e eu não sabia, calada e não
refeita, de teu sono vigilante que já não me pertence. No quarto anterior,
dormias em meu ventre, hoje o tronco no colchão firme recusa um qualquer
sincronismo com o meu desejo. Somos luz comum, porém, caminho
idêntico e diverso, o que atrai e repele, breve hesitação a minha, a de quem
transporta o recém-nascido a um ritmo novo.
Se eu chamar tua voz para meu lado, arranco a flor mutilada à superfície
da água. Mas teu labor é nocturno, ponto instável, díspar; a dúvida,
uma interrogação insidiosa. Era um segredo, o nosso, amor lento, corpo
que nos cerra e mais tarde se extingue. Se espreito, o menino morre.
Fecho então os olhos, e aprendo a ler sobre o texto o longo breve rio
entre ti e o outro, o sentido da inverosimilhança, a ausência radical e lisa.
Vou envelhecer tentando segurar a maternidade no peito.



Ana Marques Gastão

terça-feira, maio 04, 2004

I wish I wasn’t”

“I wish I wasn’t”, diz a música. Mas que digo eu? Debaixo desta chuva que não há meio de passar. De me passar, de me trespassar… Estarei eu acima de mim e do que desenhei para mim, por entre dedos incertos e olhares inacabados? Estarei aqui ou fora de mim? Estarei aqui ou aí? Mais perto de ti do que de mim, mais perto da minha solidão do que do meu desejo. Mais perto de um texto do que a fonte que o origina.

Alguém diria que estou melancólico ou pior, que sou melancólico. Se o sou é porque não me tenho, não me tenho neste momento em que prescindir de um pedaço de mim, é pedir que me estilhace na contingência do tempo e do espaço. De um tempo que ainda não se (re)faz para mim e de um espaço que se dissolve ao contrário à medida que aperto a minha mão, vazia…



A.R.