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segunda-feira, março 29, 2004

Fotografia do olhar

No limiar daquilo que quero dizer está o desejo secreto de te querer. De te abraçar ainda que não existas na mesma contingência temporal que a minha. És ainda aquela representação que não ouso trazer para a luz dos meus olhos e dos meus sentidos. Não sei quanto tempo poderei aguentar esta ausência de ti, agora que o fogo se adensa a meu corpo, à minha voz trémula que te chama em silêncio precavido e fragmentário. Estarás tu pronta para me tocar, ardente e reticente? Tocar um corpo, uma alma aos pedaços, em ruína de sentidos. Um corpo que ainda não se construiu de ti e para ti. Uma agenda de emoções e desejos que não desejo nem consigo revelar.

Hoje ousei olhar a tua fotografia, a tua representação histórica. Eras tu que lá estava, reconheci-te, mas estavas incompleta, menor, muito para além das memórias dos nossos dias. Não vi aonde estavam as minhas mãos, os meus braços. Não vi aonde estavam os meus lábios, nem o meu corpo. Estariam do outro lado da objectiva à tua espera. À espera que cessasse esta tua necessidade de te mostrares ao mundo. Essa necessidade que ainda não sentes por mim…

Depois caí, bem em cima da minha realidade. A realidade que te vê, mas não te respira. A realidade que me liga a ti, mas que te prende numa ausência de mim. A realidade que te diz que ainda te procuro, mas que elimina a resposta. É esta a justificação, não? É por isso que não me respondes? Alguém te prende o sentido e a direcção e não te deixa regressar a este lugar de partida. Ou… ou serás mesmo tu, tu que não me respondes. Tu que sorveste o último gesto que tirou a fotografia? Responde-me. Foste tu que te demitiste da direcção do meu olhar? Foste? Responde-me.


(Responde-me: aonde estás?)


A.R.

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